Eu sempre detestei a escola. Não sofri bullying, nem nada de horrível aconteceu comigo lá dentro, eu só não gostava. Na minha perspectiva, a escola era um lugar miserável, ou pelo menos é como eu me sentia lá dentro.
Olhando para trás, consigo enxergar algumas das razões que me fizeram sentir assim, e como esses elementos, pelo menos em parte, continuam presentes a nossa volta, apenas com outra roupagem.
(Acho que é importante deixar claro que sempre estudei em escolas públicas, talvez particular seja diferente, não sei.)
Chato e deprimente
Tudo era muito chato. Eu sei que muitas das coisas na vida são chatas, e não tem o que se fazer a respeito. O problema é que lá dentro, tudo era chato.
Não existia um mínimo esforço de tornar as coisas minimamente interessantes.
Tudo sempre tinha aquele aspecto de repartição pública, com um cheiro meio velho e decoração brega de muitos anos atrás. Isso em particular sempre me despertou esse sentimento ruim, como se tudo ali fosse estático, nada mudasse. Meu medo, era de que se eu ficasse tempo o suficiente ali, me tornaria igual.
Eu nunca fui um bom aluno, sempre que conseguia a oportunidade dormia durante a aula, e quando não podia fazer isso, passava todo o tempo desenhando no caderno ou fantasiando com um mundo onde eu não precisasse estar ali.
As notas eram horríveis, e mesmo assim, eu nunca reprovei, isso porque a ideia de precisar passar mais um ano lá dentro, me aterrorizava mais do que qualquer coisa, então, minha estratégia era mais ou menos assim:
Calcular quantos dias eu podia faltar sem reprovar, e faltar todos eles, enquanto fazia o mínimo necessário para que no último semestre ou trimestre, ainda fosse possível recuperar as notas e passar de ano.
Mais de uma vez eu precisei tirar dois 10 seguidos nos últimos dois trimestres do ano para passar, geralmente em matemática, física ou química, e todas as vezes eu consegui.
Eu nem vou esconder, eu tinha um certo orgulho da minha mediocridade calculada e friamente planejada, sempre conseguindo passar de ano. Me encarava como um rebelde, era minha maneira de mostrar desprezo por aquele lugar que eu odiava, sem permitir que eu ficasse preso ali.
“Ah, mas e os amigos?”
Digamos que eu nunca fui popular, e nem queria ser, eu tinha amigos fora da escola, e eles me bastavam.
De maneira resumida, a perspectiva de todo dia entrar nesse ambiente que incentiva a depressão, com aulas mais chatas do que horário politico, não era algo que me fazia levantar alegre da cama. Meus pais, coitados, tiveram que lidar com meu humor de adolescente revoltado todas as manhãs, durante todos esses anos. A vontade de me bater deve ter sido muito grande.
Mas existia ainda outro grande motivo pelo qual eu desprezava a escola, só que esse, eu só percebi depois de adulto.
Anti-criatividade
A escola para mim, sempre foi um lugar onde você segue o que mandam ou se lasca. Não pense em tentar fazer algo diferente ou criativo, o martelo sempre faz questão de bater com força no prego que ficou para fora.
Antes de entrar nesse ponto, quero só deixar claro: eu sei que nem todo professor é como os que vou descrever, com certeza, existem bons professores por aí, mas a minha experiência foi com vários bem ruins.
A primeira vez que comecei a entender que ali não era lugar de ser criativo, foi entre a sexta e oitava a série, em uma aula de português.
Recebemos a tarefa de escrever um texto, uma história, tema livre. Para dar um pouco de contexto: fora da escola, eu tinha muitos interesses, não era um ávido leitor, mas eu lia tudo que me interessava, eu já tinha um hábito de escrever diários mais ou menos formado, e eu gostava de imaginar muitas coisas.
A tarefa precisava ser entregue outro dia, mas ali na aula eu já comecei, foi a primeira história que tentei escrever, e eu achei muito divertido, comecei a escrever, página atrás de página, fiquei realmente perdido na atividade. Misturei histórias de jogos, ambientei em um shopping de Curitiba e coloquei um romance adolescente barato no meio.
Eu não lembro os detalhes, mas a história tinha Alucard(tirei de Castlevania), um acidente cósmico no cinema do shopping Mueller, e muitas piadinhas ruins.
O fim da história, é que a professora me chamou no canto, depois da entrega da tarefa, e perguntou se eu tinha copiado da internet, porque não parecia algo que eu seria capaz de escrever. Uma maneira elegante de me chamar de burro.
Depois de alguma relutância da parte dela, ela aceitou que eu tinha escrito e pediu para eu ler para a turma, que prontamente, começou a falar que eu tinha copiado da internet. Enfim, depois disso, claramente, a vontade que eu tinha de fazer algo na escola, que já era pequena, só diminuiu.
Outro episódio que vale trazer aqui, foi no ensino médio. Eu não vou lembrar qual era a fórmula, como eu disse, tudo na escola eu fazia para passar de ano e imediatamente esquecer. Enfim, eu percebi que dava para ‘cortar caminho’ se eu resolvesse a equação de um jeito diferente do que a professora ensinou. Fiz alguns testes e o resultado sempre dava certo, então concluí: ‘para que trabalhar mais, se posso fazer menos com o mesmo resultado?’.
Dia de prova, sentei, fiz todas as questões, acertei todos os resultados e tirei zero.
A justificativa da professora foi que eu não segui a maneira de resolver a fórmula, exatamente como ela ensinou. Até tentei argumentar que o resultado era o que importava, mas o zero foi para o boletim mesmo assim.
Esse dia, eu lembro que marcou o fim de qualquer resquício de vontade de fazer qualquer coisa criativa ou diferente na escola. Apenas siga o script, dance a música, faça o mínimo necessário e vá para casa.
Também é importante que para um adolescente, esse episódio não fez bem para o meu ego, que agora, acreditava ser um gênio injustiçado. Eu esquecia que eu quase sempre reprovava em matemática.
Existem outros exemplos que justificam porque eu odiei tanto a escola, e porque como alguém imaginativo e curioso, eu não me sentia bem recebido ali dentro, porém, apenas esses dois bastam para este texto.
Só que no fim, esse texto não é sobre escola, é sobre como mesmo depois de adulto alguns desses elementos continuam presentes em nossa vida.
Dance a dança
No mercado digital, vejo um comportamento meio igual. Professores que ensinam formulas que precisam ser seguidas à risca, profissionais que tem medo de fazer algo diferente e ser ‘motivo de piada dos amiguinhos’.
Saem os móveis velhos e estética de repartição pública, e entram as casas quadradas, com decoração minimalista, e o uniforme de executivos que parecem não saber escolher um corte adequando de terno.
Não se engane, é a mesma coisa, um ambiente estático, sem espaço para nada novo, siga a fórmula, dance a dança, faça o mínimo possível, o importante é vender.
A alternativa é ser o esquisito, o excluído.
Mas essas mesmas pessoas esquecem que os livros de biografias que elas postam nos stories, e colocam em suas prateleiras no cenário, um dia foram os esquisitos, a única razão de os admirarem é o sucesso que alcançaram, sem todos os símbolos de status, nunca conseguiriam discernir quando alguém fala algo de valor, sem uma Lamborghini atrás para mostrar que ele sabe do que fala, afinal, ele é rico, não é possível que ricos sejam burros.
É o desejo de ser pela imitação das coisas erradas.
Para a minha sorte, na área de ser o estranho, eu tenho experiência, e para todos que são como eu, eu lembro, ninguém aqui é mais criança, e você não precisa mais pedir permissão para ir ao banheiro.
Pare de escutar as pessoas erradas.
As pessoas me falavam “aproveita bem a escola, você vai sentir falta” e essa frase nunca foi tão errada. Eu NUNCA senti falta da escola. Pra mim foi um péssimo lugar. Lidei com um bullying mediano, mas era sempre a esquisita e antissocial. Graças a Deus por isso! Só hoje enxergo. Escola é realmente uma prisão e você vai lidar com muitos delinquentes juvenis e projetos de pessoas péssimas. Adorei o texto!
Esse é um daqueles assuntos que virou “tabu” principalmente depois do homeschooling. Quando questiono se escola é um ambiente pra todo mundo, ouço que meu questionamento é absurdo, que “todo mundo precisa estudar”. Ok, mas será que o estudo só é possível nesse formato?
Eu estudei em escola pública e particular e te digo: pouco muda, a particular pode até ter uma estrutura melhorzinha, mas nada “uau”, nenhuma estética que inspire estudo, erudição, aconchego. No fim, pra mim, é igualmente deprimente, professores que não estimulam, um monte de matéria cujo assunto você nunca mais vai usar porque são mega específicos (sei lá, até hoje não usei logaritmo, nem precisei saber dos afluentes do rio Amazonas).
Fui uma boa aluna, mediana (nunca brilhante) e tampouco sofri bullying e tenho a mesma impressão que você.
A escola pode ser boa para algumas pessoas, mas entendo que com certeza não é pra todo mundo!
Excelente texto!